A matéria, no seu sentido clássico, é essa massa amorfa a partir da qual o nosso mundo adquire existência física. A matéria da madeira e do metal começou por materializar formas tipográficas, dando-lhes substância enquanto, simultaneamente, atribuía significado às mesmas. Hoje, as formas/fórmulas digitais (Flusser, 1999: 35-38) parecem não ter matéria — embora a sua existência seja possibilitada através de infraestruturas tecnológicas materiais —, mas continuam a materializar a nossa experiência no mundo.
Numa era em que assistimos a um regresso às práticas tipográficas tradicionais, trazendo-as para o presente, onde se criam e metamorfoseiam formas e usos tipográficos sem existência física, e também onde o design e a tipografia se configuram na articulação entre o tangível e o digital, a palavra “matéria” — nos seus diversos sentidos — abre horizontes para questionar as práticas tipográficas contemporâneas.
Os significados da matéria conduzem-nos, assim, a pensar e a interrogar o design, e particularmente a tipografia, a partir das seguintes perspetivas: Matéria como substância que, uma vez informada por letras, se torna inteligível e cria significados. O que constitui esta substância na tipografia atual?
Adicionalmente, a sua característica amorfa revela a amplitude das possibilidades formais e dúcteis, em consonância com os diferentes meios através dos quais a tipografia é produzida. Entre o analógico e o digital, o espaço físico e o virtual, e todas as combinações possíveis. Quais são estes fluxos e que implicações têm no design? Como é que a mesma (metafórica) matéria se metamorfoseia em materiais diferentes? Quais são as metamorfoses da(s) tipografia(s)?
Além disso, através da conceção da matéria como aquilo que é tangível — remetendo-nos para o mundo físico que simultaneamente possibilita, organiza e condiciona a nossa experiência individual e partilhada —, podemos questionar os diferentes sentidos em que a tipografia se torna tangível, ou seja, segundo os quais participa na formação da nossa experiência do mundo. Nesse aspeto, a matéria contextual da tipografia, na prática, os seus meios, é também particularmente relevante.
Por fim, as dimensões políticas, sociais, históricas, culturais e ambientais, entre outras que desafiam o papel do design, são fios que percorrem todas essas questões e se cruzam, configurando assim a teia da matériadoTipo.